Por: Karoline Alves
Arte, bailado e muita tradição. O dia do mestre-sala e porta-bandeira é celebrado em 10 de junho em São Paulo, uma data que passou a integrar oficialmente o calendário paulistano em 2011. A homenagem aos artistas que representam a cultura do Carnaval acontece no mesmo dia em que, em 2009, a vida de Maria Gilsa, uma das porta-bandeiras protagonistas da história do samba paulistano, foi agraciada na Câmara Municipal.
O legado de Maria Gilsa se estende não só com a comemoração, mas também através do bailado de Adriana Gomes, sua filha e porta-bandeira oficial da Mancha Verde: “Vendo ela em casa, eu acabei me tornando uma pessoa que faz tudo o que ela fazia, com entendimento, acolhimento, compreender o lado do casal iniciante ou, também, dos casais que disputam comigo, somos muito juntos, muito próximos e ela era muito agregadora”, conta. A data é especial para Adriana, não só pela arte: “É um dia de renovar a lembrança da sabedoria, da humildade e do prazer que ela tinha em ser porta-bandeira e passar isso a frente”.
Tradição
A dança surgiu com os ranchos carnavalescos, com o objetivo de defender o símbolo maior do grupo. A defesa era literal, uma vez que as associações tentavam roubar a bandeira umas das outras. Hoje é apenas um elemento tradicional. A dança do mestre-sala corteja a porta-bandeira e passa a sensação de proteção do símbolo maior da escola de samba: o pavilhão. Ela, por sua vez, é responsável por conduzir e ostentar o elemento que carrega a história do grupo. Não se curva diante de ninguém e mantém desfraldada a bandeira da agremiação.
Em São Paulo, o casal de mestre-sala e porta-bandeira é um dos nove quesitos avaliados em um desfile de escola de samba. Dentro dos pontos observados pelos julgadores, estão o entrosamento do casal durante o bailado, a postura de ambos e a integridade das fantasias.
A perpetuação do bailado
O acolhimento faz parte da cultura do samba e o bailado de um mestre-sala e porta-bandeira só se aprende dentro da quadra de uma agremiação. Além da técnica, um casal carrega valores e história. Para perpetuar a cultura e a arte, há iniciativas de todos os tipos em associações e agremiações.
Desde 2004, o Cisne do Amanhã forma casais para as escolas de samba de São Paulo, como a Tom Maior. O principal objetivo, segundo a associação, é lapidar novos talentos. A troca de experiência é valiosa: “Nós temos um método diferente de trabalho de todas as outras escolas de mestre-sala e porta-bandeira. Fazemos um trabalho sem dividir por sala, fazemos em sala única com todo mundo, aquele que está começando a dançar hoje e aquele que já dança há 50 anos. Nós acreditamos que, desta forma, aquele que sabe um pouquinho a mais acaba passando para aquele que está começando”, explica José Luis, presidente da Associação Cisne do Amanhã e mestre-sala oficial da Leandro de Itaquera. O projeto tem, atualmente, cerca de 200 alunos. Entre os formados pela iniciativa, estão Ruhanan Pontes, mestre-sala oficial da Colorado do Brás, e o próprio José Luis.
Dentro do Raça Centro de Artes, Delma Nogueira coordena o projeto Pavilhão em Movimento, que une a dança do casal de mestre-sala e porta-bandeira com modalidades como o ballet e o jazz, e trabalha a expressão corporal com afro, jongo e samba de roda. O diferencial aqui é a metodologia Roseli Rodrigues, fundadora da companhia de dança. O projeto Pavilhão em Movimento tem docentes conhecedores da arte, como Ana Cecília Zarantoneli, Chris Brasil, Paulo Guedes, Paula Penteado, que ocupa o posto de primeira porta-bandeira do Vai-Vai, e Laís Moreira, porta-bandeira oficial da Unidos de Vila Maria.
Na Acadêmicos do Tatuapé, todos os mestres-salas e porta-bandeiras são formados pelo projeto Casal Foguinho, liderado por Diego e Jussara, que conduzem o pavilhão oficial. A Mocidade Unida da Mooca também ensina mestres-salas e porta-bandeiras, na Academia de Casais.
Individualmente, a porta-bandeira Edilaine Campos, que ostenta o pavilhão oficial da Estrela do Terceiro Milênio, também passa à frente a arte do bailado para uma aluna.
Projetos futuros
Por causa da pandemia, grande parte dos projetos foi modificada ou guardada para o futuro. Um exemplo é a Amespbeesp, que há exatos 26 anos transmite conhecimento para várias gerações de mestres-sala e portas-bandeiras. Hoje, os cursos de bailado estão paralisados, mas a teoria e história continuam sendo trabalhadas em atividades on-line.
Dentro da Unidos de Vila Maria, Laís Moreira ensina a dança de mestre-sala e porta-bandeira na agremiação da zona norte.Com a pandemia, o projeto não foi retomado, mas as aulas voltarão a acontecer assim que houver condições seguras. É o caso de Jéssica Gioz, porta-bandeira da Império de Casa Verde, que foi mais uma que precisou adiar os planos. Diante da procura na comunidade, Jéssica se dispôs a ensinar e a agremiação cedeu o espaço para o aprendizado. “Havia uma expectativa de início das aulas no ano passado, em abril de 2020, contudo, a pandemia nos fez adiar esse projeto que já contava com cerca de três meninas interessadas. A princípio, as aulas seriam para meninas da própria comunidade durante os meus ensaios, num formato reduzido para que eu pudesse dar atenção a cada uma individualmente”, explica.
Outro projeto interrompido foi o de Waleska Gomes, porta-bandeira oficial da Acadêmicos do Tucuruvi. Waleska usava a quadra da avenida Mazzei para ensinar crianças. O mesmo aconteceu com a escolinha de mestre-sala e porta-bandeira da Brinco da Marquesa, coordenada pelo mestre-sala Ronaldinho. As aulas voltam assim que a diminuição da disseminação de coronavírus em São Paulo permitir.
Dentro da Barroca Zona Sul, dois projetos aguardam a redução dos casos de covid-19 para saírem do papel: o Bailado em Verde e Rosa, um workshop para casais do iniciante ao avançado, com aulas de história da dança e movimentos essenciais; e o Arte em Verde e Rosa, para aperfeiçoamento dos artistas com modalidades que vão além do bailado de mestre-sala e porta-bandeira, como ballet , jazz , contemporâneo, zouk , danças de salão, teatro, passarela, bateria, judô, capoeira, samba, consciência corporal, pilates e tudo mais que puder agregar na formação completa, com foco na arte do casal. Ambos são liderados pela porta-bandeira oficial da escola, Lenita Magrini, com o apoio do mestre-sala, Igor Sena.
Na Mancha Verde, a previsão de início para o projeto coordenado por Adriana Gomes é em 2022. Futuramente, escolas como Nenê de Vila Matilde, Camisa 12 e Unidos do Peruche também projetam aulas para mestre-sala e porta-bandeira.